sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Terra Sonora na Oficina de Música

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Bons apreciadores deliciam-se em experimentar sabores oriundos de diversas regiões do mundo. Assim é que temos hoje uma grande diversidade de restaurantes especializados em gastronomia japonesa, chinesa, italiana, indiana, coreana, espanhola, americana, libanesa. Não há nada mais chique. E quem não se presta a experiências gustativas merece a pecha de "enjoado".

Mas e os sons?

Traçando um paralelo com a gastronomia, onde há o glamour da "cozinha internacional", existe uma febre também da world music ou música étnica. Neste selo do mercado fonográfico incluem-se os grupos musicais não tão ligados à tradição européia - cujos sons se fundam numa cultura musical tradicional, de raízes não ocidentais.

Curitiba tem, há 15 anos, um grupo musical especialmente dedicado à pesquisa deste universo sonoro que escapa à tradição da modernidade européia. É o grupo Terra Sonora, que fez seu concerto ontem à noite como parte da programação da Oficina de Música de Curitiba.

Dirigido por Liane Guariente e Plínio Silva, o grupo se dedica à pesquisa de repertório musical de várias regiões do mundo. Aliás, dizer que pesquisam repertório é pouco. Pode dar a entender que a pesquisa se resume a colher composições musicais para execução. Não é apenas isso. A pesquisa envolve instrumentos musicais e técnicas de execução. E envolve as especificidades da pronúncia da língua e do tipo de emissão vocal característica do canto em cada região escolhida.

Assim, o grupo nos proporcionou ontem uma viagem musical muito peculiar. Polônia e Sri Lanka. Chile e Moldávia. Brasil e Macedônia. Posso estar equivocado em alguma coisa porque não consegui pegar o programa - fui com duas crianças ao concerto, cheguei em cima da hora, peguei fila na bilheteria (que não permitia compra de ingresso antecipada). Mas acho que tudo bem, porque eles mudaram bastante o programa, como já é tradição. O que importa é dizer que o concerto seguiu a lógica de executar sempre sequencias (será que é assim que se escreve agora?) de duas músicas de regiões distintas. O par inusitado permitiu observar semelhanças incríveis.

Aliás, o grande interesse que o trabalho do grupo desperta vem dessa possibilidade de conhecer o mundo. Não é um conhecer turístico, aquela coisa de viajar com pacote e guia, hospedar-se em resort e passear em shopping, além de comer fast food. É um conhecer mais profundo. As ligações íntimas e inusitadas entre os modalismos de muitas regiões do mundo. O pensamento, o sentimento e a cultura pré-capitalistas que unem todos os povos num extrato submerso de tradição oral - condenada ao desaparecimento pelo mercado.

Instrumentos modernos como flauta, violão e violino, conjugam-se à instrumentos esquecidos há séculos, como o cromorne. Instrumentos ocidentais misturam-se aos de outras procedências. Essas combinações nos mostram a possibilidade de convivência. Está um outro sentido para o termo "buscar novas harmonias". Tecnicamente, significa a pesquisa de acordes, bem como de combinações e relações entre eles. Num sentido mais amplo, mais etimológico, as harmonias envolvem combinações de timbres, de mundos sonoros, de jeitos de tocar e cantar - bem como de conceber música.


( a imagem veio daqui)


Bem, não adianta eu ficar falando muito aqui. Você tem que ouvir os discos do grupo ou assistir um concerto para entender melhor do que se trata.

O Plínio e a Liane são meus colegas de departamento na FAP. E lá fazem um trabalho fantástico com os alunos em grupos como o Baiaka e o Omundô. Aliás, a formação do Terra Sonora ontem foi diferente da que está no sítio do grupo. Inclui hoje alguns ex-alunos do Plínio e da Liane na FAP, como o Gustavo Proença, o Tiago Portela, a Carla Zago. Destaque para Daniel Farah, um cantor especialíssimo, capaz de absorver os ensino da Liane a ponto de conseguir reproduzir o canto bi-fônico da Moldávia. A própria Liane não o faz por ser algo possível apenas ao aparelho vocal masculino.

Outra coisa que está diferente no sítio do grupo é que já são 4 CD's gravados. Aliás, o Plínio contou no concerto que já há um quinto em projeto, como parte do Projeto Pixinguinha da FUNARTE, para o qual o grupo foi selecionado. O projeto incluirá o novo CD e uma turnê do grupo pelo estado do Paraná.

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